quarta-feira, fevereiro 11, 2009

Marcelo Coelho, blogueiro e colunista fa FOLHA queria escolher a escola do filho. Fala muito do Santa. Volto depois pra comentar e posto em seguida suas palavras retiradas de seu blog.

escolhendo a nova escola

Não fujo ao bom senso dizendo que escola tem de ser perto de casa; e que, por menos “elitista” que seja a nossa ideologia, na hora de escolher uma escola para os filhos seria tolo não procurar as mais conceituadas.

Meu filho de seis anos, depois de experiências ambíguas na sua educação pré-escolar, chega na idade de entrar no que antigamente se chamava primeiro ano do primário, e agora atende pelo nome de segundo ano do fundamental.

Deve entrar numa escola na qual ficará até o colegial, ou talvez até a faculdade.

Na minha região, e na minha faixa de renda, várias escolas poderiam, em tese, acolhê-lo. Há, por exemplo, o Vera Cruz, o Santa Cruz, o São Domingos e o Carlitos.

naliso brevemente alguns dos fatores em jogo.

Devo dizer, a título preliminar, que odeio todas as escolas. Sei o quanto há de burrice e violência em todas elas. Sofri muito com a opressão que a maioria dos alunos exerce sobre a minoria dos que querem acertar, dos que levam a sério as responsabilidades do estudo, dos que procuram se interessar pela matéria.

Fiz o quarto do ano do primário no Vera Cruz. Naquela época, o Vera Cruz não prolongava o ensino até o ginásio e o colegial.

Saído de uma escola fascista, o Dante Alighieri, surpreendi-me favoravelmente com o grau de liberdade que era concedido aos alunos do Vera Cruz.

Era uma vida mansa de funcionário público. Toda segunda-feira, havia uma série de liçõezinhas mimeografadas que a gente podia escolher numa espécie de escaninho ao lado da lousa.

Você fazia as lições, entregava, e estava com a vida feita. Aconteceu-me de terminar todas as lições numa manhã de quarta-feira. O resultado é que, nos dias seguintes, eu ganhava um recreio adiantado: duas horas e meia de lazer até ser chamado de novo para alguma prática de grupo –onde teria de tolerar, coisa que fazia mal, o atraso de meus coleguinhas.

A vantagem de um esquema liberal desse tipo é que você sente menos a opressão dos adultos. A desvantagem é que, quanto menos assustadores os adultos, mais violentos e invejosos se tornam os meninos de sua idade.

O Vera Cruz foi, em todo caso, um motivo de lembranças razoavelmente amenas para mim.

Decepciona-me, agora, o fato de que o sistema de apostilas se tornou cristalizado até a oitava série. Ou seja, antes do colegial, pelo que me informaram, nenhum livro didático é adotado na escola.

Como assim? Não existe coisa mais confiável e prazerosa do que um livro didático. Por mais que tenha falhas, e seja superficial, confere uma segurança ao aluno. Qualquer coisa mal-explicada pelo professor pode ser conferida ali. Se eu quiser me adiantar ao conteúdo das aulas, o livro me traz as informações de que necessito.

Um livro é sólido, objetual, encadernado. Apostilas se espandongam no meu fichário. Transmitem-me uma idéia de confusão, e de dependência perante o professor. Não, isso foi decisivo para que eu rejeitasse o Vera Cruz como escola de meu filho.

Continuo depois.

PS- Não gosto de usar o termo "fascista" a torto e a direito, só para caracterizar sistemas de pensamento que não aprovo. Como o Dante Alighieri tinha muitos italianos, acho que houve também um certo preconceito nessa adjetivação. Eraum colégio autoritário, massificante e atrasado, mas retiro o "fascista".


escolhendo a nova escola (2)

Estudei no Colégio Santa Cruz de 1971 a 1976, e imagino que, naqueles anos, alguma espécie de compromisso político tenha sido feito de modo a acomodar professores de esquerda dentro do corpo docente, abrindo concessões a direitistas em diversas disciplinas.

O resultado é que o ginásio, de modo geral, tendia para o apoio ao regime militar, e o colegial “abria a cabeça” dos alunos.

Na sétima e na oitava série, o professor de Geografia entregava-se a rasgados elogios ao presidente Médici. No colegial, os professores de Geografia nos ensinavam materialismo histórico, com esquemas sobre forças produtivas, relações de produção, etc., ou então passavam textos do jornal “Movimento”.

Um arranjo desse tipo é plenamente compreensível. Mas o preço, no que diz respeito à qualidade do ensino, tornou-se muito alto. No ginásio, os professores eram de modo geral fracos, inseguros ou corocos. Os que faziam mais sucesso, salvo duas honrosas exceções, em Ciências e História, eram autoritários, terroristas e covardes.

Covardia é o termo mais exato, na minha opinião, para a atitude de qualquer professor que pegue um menino de onze, doze ou treze anos, e pela violência verbal o faça chorar. Naturalmente, não são os tipos mais delinqüenciais que são submetidos a esse tipo de tratamento. Nem os bons alunos. Pega-se aquele tipo médio, meio obscuro, que por acaso se meteu em alguma enrascada ou que fez uma piada fora de hora. Havia exemplos disso mais ou menos uma vez por mês no Santa Cruz.

Fruto de um misto de ambigüidade e arrogância que faz parte, acho, do DNA daquele colégio.

O tempo todo os professores faziam propaganda da própria escola. “Estamos formando as elites do país”, “vocês são a elite”, é um privilégio estudar aqui, esse tipo de coisa se ouvia o tempo todo. Não é a mensagem mais saudável que se possa dar à quantidade de filhos de banqueiros, industriais, comerciantes, grandes advogados, etc., que estavam ouvindo tudo aquilo.

Não havia só ricaços. Mas estes, de modo geral, deixavam bem clara para os demais a sua condição. Cartas de cobrança de mensalidade atrasada eram entregues aos alunos do ginásio em plena sala de aula. Claro, ninguém dizia, mas todos sabiam, que era disso que se tratava.

Certa vez, o vice-diretor do ginásio entrou em classe com uma cartinha dessas. Todos os alunos se puseram a escarnecer do menino que a recebeu. No meio da confusão geral, um daqueles garotos obscuros, em quem ninguém prestava atenção, criou coragem e gritou “caloteiro”!

Foi a deixa para o vice-diretor dar a sua liçãozinha de moral. Investiu contra o garoto xingador, sob o silêncio aterrorizado da classe. “Mesmo que ele fosse caloteiro, coisa que ele não é, ele seria melhor do que você está sendo agora!”

O menino, que simplesmente seguira a onda da classe inteira, tornou-se bode expiatório da mesma classe que pensava exatamente como ele.

Gostaria de ter levantado a mão e dito: “por que não entregam a carta no endereço dele, em vez de fazer isso em público?” E por que dar uma lição importante de moral usando o terror, de modo a responsabilizar apenas uma pessoa por uma canalhice coletiva?

Não era eu o caloteiro, nem fui eu quem o xingou. Eu ficava em silêncio nesse tipo de manifestações coletivas. Fiquei demais em silêncio naquele colégio. Gostaria de ter estudado num lugar que não premiasse a covardia moral; desta, tínhamos exemplos quase diários no Santa Cruz, dados por professores e alunos. Continuo depois; quem sabe escrever sobre isso tudo me tire um pouco do rancor, do qual peço desculpas a quem me leu até aqui.


escolhendo a nova escola (3)

Continuo a falar das “escolas de elite”. Apesar de ter grandes professores no colegial, o Santa Cruz (onde estudei de 1971 a 1976) era muito falho numa área em que, teoricamente, deveria ser ótimo. Refiro-me ao curso de Filosofia.

Embora eu fosse bom aluno, o fato é que cheguei à faculdade ignorando tudo o que de fato é relevante nessa matéria. Isso se deve à orientação religiosa do colégio, que fez do curso de Filosofia uma espécie de “trajeto” que saía da angústia existencialista para chegar à fé de Teilhard de Chardin. Jogavam-se nas mãos dos alunos livros de Kafka e de Sartre, alimentando o ego pretensioso dos que se julgavam “elite”, para depois impor uma suposta “solução”, que ninguém nunca entendeu direito, em torno das concepções católico-científicas de Teilhard de Chardin.

Isso podia ser apenas idiossincrasia do “filósofo” de plantão, o Padre Charbonneau, que de vez em quando aparecia para dar conferências a que todos assistiam boquiabertos. Duvido que entendessem alguma coisa; eu pelo menos, que era dos mais cdfs, nunca retive daquelas ocasiões mais do que a imagem de um rosto que se avermelhava, avermelhava, chamando Sartre de “raposa velha”. Como se aqueles padres não o fossem.

Mas o problema não é a idiossincrasia, é a ambiguidade de um colégio que se dizia liberal mas não era, e que era de padres mas não era. Tínhamos, assim, aulas de religião todos os anos do ginásio, só que sob o nome de “Animação Espiritual”. Tínhamos um sistema rígido de avaliações, só que se usava conceitos em vez de notas numéricas. Líamos, supostamente cultos, Sartre e Kafka, para depois escrever em cima das coxas trabalhos criticando os dois autores a partir de uma obscura filosofia cristã.

Tínhamos a propaganda de que o colégio era liberal, enquanto professores bons ou ruins impunham terror na classe, e um professor de ginástica era adepto de castigos fisicos para quem chegasse atrasado ou com a blusa para fora da calça.

Uma vez, os alunos se revoltaram contra o famoso “corredor polonês” que iniciava toda aula de Educação Física. Recusaram-se a bater nos colegas. O efeito foram cinquenta minutos de abdominais, flexões e polichinelos, o que dissuadiu para sempre a classe de qualquer resistência ao sistema anterior.

No colegial, isso terminou; supostamente mais “adultos”, os meus colegas se dedicavam a intimidar os alunos menores. Certa vez, promoveram uma festa do ovo, na qual um menino de sete anos mais ou menos foi atingido sistematicamente. Nessas ocasiôes, ninguém mais do que eu aprovaria uma reação das mais autoritárias e terroristas contra esse tipo de molecagem. Houve um sermãozinho espantosamente compreensivo e só.

Talvez fosse esse mesmo o objetivo: é com essa hipocrisia que se aprende a ser elite, no Brasil ou em qualquer outro lugar.

terça-feira, dezembro 09, 2008

Rápidas XVII

1. Atividade
Espero que as férias tragam de volta meu tempo de expor idéias nesse espaço aqui. Planos eu tenho; queria falar um pouco de política nacional, de algumas questões que aí estão na mídia, que estão acontecendo na Universidade de São Paulo. Um balanço-2008 seria no mínimo interessante também. Eu penso que devia soltar uma 'Rápidas' antes de qualquer coisa, e aí está.

segunda-feira, novembro 10, 2008

Rápidas XVI

1. Catracanasarcadas II
Após mobilização estudantil intensa conseguimos barrar a instalação de catracas na Faculdade de Direito e a formação de uma comissão paritária para discutir medidas de segurança. Pode essa ser a primeira derrota de João Grandino Rodas na sua corrida para ser reitor da Universidade?

2. Anistia? II
Tem saído muitos textos nos jornais de grande circulação sobre o assunto. Aparentemente a ministra Dilma Roussef, a presidenciável, pulou para o time dos ministros Genro e Vannuchi, o time dos "revanchistas", diz o outro lado. Quem fez feio foi a Advocacia-Geral da União, a AGU, que soltou um parecer contra a revisão da Lei da Anistia.

terça-feira, setembro 02, 2008

38.

Como já coloquei nas Rápidas anteriores acho esse debate sobre a revisão da interpretação da Lei da Anistia muito importante. É muito importante a composição da memória coletiva do brasileiro em rumos mais progressistas que esse debate seja feito e que sejam punidos e reconhecidos moralmente aqueles que em nome de todos nós torturaram, mataram e fizeram desparecer homens e mulheres que lutavam pela liberdade, munidos de um único direito, o de resistência contra um regime de exceção assassino.



Nossa Lei da Anistia
e a infame tentativa de esquecer feridas e igualar desiguais

No final do regime de exceção iniciado em 1964 no Brasil os militares, ainda no poder, gradualmente programam sua saída e concedem a todos os envolvidos em "crimes políticos" a anistia "ampla, geral e irrestrita" em lei que livrava tanto a cara daqueles por tanto perseguidos pelos fardados quanto dos próprios agentes da exceção, da tortura, da Ditadura. Hoje se debate pela revisão na interpretação dessa lei. A tortura, segundo alguns tratados internacionais que o Brasil assina, é um crime lesa-humanidade imprescritível, ou seja, deve ser punido mesmo 20 anos depois de ter acontecido.
Os lados se acirram e aqueles que defendem o tampão na memória seguem pelo argumento da segurança jurídica, da prescritibilidade do crime no sistema jurídico nacional e de uma pretensa eqüidade entre aqueles que cometeram os chamados "crimes políticos" pelo lado da Ditadura e aqueles que resistiram a ela, os tachados "terroristas", que praticaram atos como seqüestros, por exemplo. Nesse último recurso se coloca que se a lei for revista para o lado dos torturadores ela também deve ser flexibilizada àqueles que cometeram tais crimes, por estes também serem atos de violência igualáveis aos cometidos pelo Regime Militar, de mesma gravidade.
Esse assunto é muito importante pois nos lembra que nem sempre com a lei vem o que é mais certo ou o que é justo, e que muitas vezes dá pra ser perverso e completamente injusto seguindo e obedecendo a todos os diplomas legais. Todos esses institutos jurídicos, devemos lembrar, são invenções nossas - são abstrações que podem muito bem ser véus ilusórios se não nos atermos ao conflito de fato, ao que está em jogo não só no mundo jurídico como no mundo concreto. O direito não é nem nunca foi força-motriz de nada, dele, ou de dentro dele e de seu amado dogma do "estademocrátidedireito", não sai nem nunca sairá nenhuma das grandes conquistas que já foram alcançadas pelos movimentos sociais populares que lutam por direitos humanos e sociais. O direito, no limite, efetiva conquistas depois de muitas pressões sociais, e por isso aquelas argumentações que ficam só no plano do direito perdem o chão e se mostram completamente mancas pois não contam com a base essencial de uma análise completa das nervuras sociais afetadas pelo conflito e sobre o que cada um ganha e perde com a decisão X ou Y.
É evidente que a questão não é simples, se o fosse já teria sido resolvida, até porquê questões que envolvem o embate de forças reais que agem na sociedade nunca são simples. O porém é que muitas vezes é alegada uma complexidade para colocar os defensores da punição aos torturadores como ato de revanchismo e simplismo intelectual, reducionismo autoritário. Não é revanchismo, não é simplismo ou reducionismo e nem é complexo para aqueles que foram torturados barbaramente por se insurgirem contra um Estado que matava, censurava e calava em nome de todos nós, dizer que aqueles que os torturaram devem ser punidos por isso. A complexidade vai até o ponto em que pensamos em que existem diferenças qualitativas gritantes que afastam os argumentos da prescrição e principalmente aquele da "flexibilização" da Anistia para ambos os lados.
No que diz respeito à prescrição, entrando no mérito jurídico, pois apesar deste campo não ser o da discussão principal nem prover os elementos mais caros ao debate ele faz sem dúvida uma mediação importantíssima, ela é um instituto pensado conforme algumas problemáticas determinadas, óbvio que dentro do que são abstrações jurídicas típicas. Ela existe por conta de que: (1) depois de um bom tempo cessaria o interesse social na resolução daquele crime se nada se apurasse, e; (2) depois de um bom tempo a identidade do réu é transformada, ele não é mais aquela mesma pessoa que cometeu o crime. Nessa questão é essencial que pensemos que o interesse social nesses crimes cometidos pelos agentes da Ditadura é completamente excepcional comparado à daquele crime passional cometido na esquina - estamos tratando aqui de questões de Estado brasileiras, de crimes cometidos em nome de todo o nosso povo, e negar que existe um interesse social ainda latente nessa memória, e não de um grupo de lamuriadores solitários, é tapar o sol com a peneira. As manifestações de setores inteiros do Ministério da Justiça e da Secretaria Especial de Direitos Humanos provam que não é um grupelho que isso reinvindica, mas sim segmento importante da sociedade brasileira. Segunda questão sobre a prescrição é que os réus se beneficiaram grandemente com a conjuntura política no cenário da promulgação da lei, que foi feita ainda durante o Regime Militar, de cima para baixo. Será que as identidades mudaram tanto assim? Muitos, muitos mesmo, ainda continuam sustentados pelos impostos de milhões de brasileiros.
E, por fim, a triste tentativa de igualar e justapor como idênticas coisas completamente desiguais. É completamente descabida a colocação de que a flexibilização da interpretação da Lei da Anistia deveria servir aos ditos "terroristas" que cometeram "crimes políticos igualmente violentos". Devemos enumerar as diferenças qualitativas: (1) Não podemos chamar de "terroristas", meros criminosos, se pensamos que aqueles que resistiam agiam no único direito que lhes fazia sentido, um Direito de Insurgência contra um Estado Assassino de Direito, que caçou como um lobo faminto todos aqueles que se levantavam contra suas atitudes. Esse direito não é uma invenção e sim uma construção histórica que remonta os clássicos políticos - temos direito de nos rebelar contra um Estado que quebra o pacto e que se volta contra as nossas liberdades que ele deveria garantir, diz Rousseau; (2) É inegavelmente qualitativa a diferença daqueles que cometem atos de violência sob o manto do mando do Estado, em nome de todos, àqueles que agem com violência para resistir e lutar contra o mesmo - essa qualidade de estar revestido da autoridade do monopólio legal da força é crucial e esse mérito contribui para percebermos a incoerência de igualar o que é materialmente desigual; (3) Os membros da resistência, os ditos "terroristas", nós sabemos os nomes de todos. Não sei o nome de nenhum torturador-geral da república do Regime da Revolução de 1964. Isso representa que alguma coisa não é tão igual assim; (4) É muito diferente o fato que as medidas de violência do lado da resistência democrática foram exceção da regra e do lado da Ditadura foram a regra da exceção. É cruel e sem cabimento igualar a violência do opressor, ainda mais sendo ele o Estado, à resistência enérgica do oprimido.
A diferença nas qualidades das situações analisadas nos leva à discussão de mérito e coloca em xeque a tentativa de deixá-los aparentemente idênticos como simples atos de violência, que se equiparam e se anulam. São coisas diferentes no mérito e devem ser tratadas como diferentes. Lembremos que essa não é discussão técnico-jurídica, é discussão jurídico-Política, assim, com "P" maiúsculo.
Sempre fazem alarde com os princípios da democracia brasileira. Acho que um deles, importantíssimos para tanto saldar dívidas com o passado como para bem-resolver o futuro e condenar de vez momentos históricos lamentáveis, é um princípio do direito à memória, do direito à história. E é história de nosso país que houve Ditadura e que ela, por meio de seus agentes torturou Fulano, Beltrano e Sicrano que resistiam à idéia de um regime de exceção onde poucos decidiam por muitos rumando o Brasil numa trilha de desigualdade e fissura social. O medo e a falta de vontade em punir os torturadores é aliada do esquecimento e do tampão histórico e, comos disse Silas Cardoso, esquecimento tem lado claro determinado na correlação de forças sociais que agem em nosso país.
Rápidas XV

1. Catracasnasarcadas
A cruzada do diretor João Grandino Rodas para a aprovação do pacote de "medidas de segurança" na São Francisco vêm acompanhada de uma ânsia por "racionalizar" espaços estudantis, ou seja, utilizá-los para a promoção de uma marca, a saber, a Livraria Saraiva. Boatos rolam soltos por essas bandas que o diretor já selou um acordo com a Livraria para a utilização dos espaços do SAJU e da Atlética. É ver para crêr, lembrando que ano que vem tem eleição para reitor na USP e todo mundo sabe quem quer sair candidato.

2. Anistia?
Setores do governo se movimentam a favor da revisão da interpretação da chamada "Lei da Anistia", promulgada ainda no fim do regime militar brasileiro. Os ministros Tarso Genro (do Ministério da Justiça), por intermédio da Comissão de Anistia do MJ, e Paulo Vanucchi (Secretaria Especial de Direitos Humanos) promovem um debate acerca da punição dos agentes torturadores da Ditadura Militar, baseados nos inúmeros tratados de Direito Internacional dos quais o Brasil é signatário que colocam a tortura como crime lesa-humanidade imprescritível (no juridiquês aquele crime que não prescreve, ou seja, que sempre pode ser punido, independente quanto tempo passou desde sua consumação), que, portanto, não seria passível de Anistia. Do outro lado os militares e setores conservadores falam de revanchismo, de segurança jurídica e do fato que "bom, se vai flexibilizar tem que flexibilizar para aqueles 'terroristas' que cometeram crimes graves também, como seqüestro" (tentando equiparar a tortura cometida por agentes do Estado a crimes cometidos por grupos de resistência ao Regime Militar).
Esse debate é muito importante. Ele é o debate do direito de um país à memória e deve ser feito com muita atenção.

quinta-feira, agosto 28, 2008

37.

Grades, alambrados, câmeras e catracas sempre foram assunto recorrente aqui no Palavras, principalmente quando eu falava sobre meu ex-colégio. Primeiro tratei disso na parte três de "Palavras de Ordem", o texto, na seção "Arqu
itetura da destruição". Depois escrevi mais sobre grades em "Pedagogia do enjaulamento" e em diversos outros posts mais rápidos. O que eu nunca tinha pensado era que eu ia acabar escrevendo sobre as mesmas coisas, só que desta vez elas não estão presentes no meu passado cotidiano de colégio particular, mas no meu presente dia-dia de faculdade pública.


CatracasnasArcadas I

Angústia
Nesse mês chega à Congregação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo para aprovação a proposta de permissão de "reforços na segurança" da dita Faculdade. Um pacote composto por catracas que controlariam as entradas, câmeras de vigilância e outras medidas aparece nesse momento com apoio veemente de muitos professores e visa combater "falhas na segurança do prédio", segundo eles evidenciadas por alguns fatos de violência como furtos, um assalto e algumas outros tipos de ocorrências. Essa proposta é encabeçada pelo diretor da Faculdade, o professor João Grandino Rodas, já notório por ter inaugurado a recente tradição de truculência no trato a estudantes e movimentos sociais.

Catracas
Uma catraca faz a mediação de uma decisão de quem entra e quem fica de fora. É uma máquina que lendo um código, um número ou uma identificação qualquer permite a entrada de alguns e barra outros. Decidir vem do latim decidere, que significava "cortar", "dividir". De fato - esse aparelho divide o espaço em dois - um público, a rua, e um menos público (eufemizando). Ele devidamente corta a realidade em dois pedaços e aliena uma das partes para um grupo restrito de pessoas que daquele local/aparelho urbano podem usufruir sem serem incomodadas pelo resto excluído.
Isso sem dúvida tem uma carga de violência pois é uma das representações físicas, arquitetônicas, de uma situação na qual se arranca de muitas pessoas até mesmo o pode pensar em entrar naquele lugar sem sofrer represálias. Não só o dito prédio mas toda uma comunidade, com o intuito de se proteger e de melhor se controlar, instala catracas para isso.
Então o debate sobre catracas e sua função se coloca então em dois planos de discussão, que se diferenciam apesar de fazer sentido tratá-los de maneira paralela pois não há aporia completa entre os dois campos. O primeiro é o conflito entre a segurança dos membros da comunidade-prédio e o seu caráter mais ou menos público. O segundo é sobre como reivindicamos a palavra controle - se ela somente significa eficiência ou se também pode ser identificada como dominação - pois evidentemente a função da catraca, o motivo alegado para aquele objeto lá estar, é essa palavra, controle.
O primeiro debate é levado de um lado a outro rapidamente conforme o caso concreto, conforme a comunidade-prédio que estamos analisando. Muda o valor da segurança e do caráter público para aquele edifício e na relação deste com o todo social que o circunda se ele é um lugar onde se realizam trocas comerciais, se ele é um prédio de apartamentos ou se nele se instala algum órgão da administração pública municipal por exemplo. Faz mais sentido que se dê mais valor à segurança mais do que à publicidade de um edifício residencial, dado que a casa das pessoas é um ambiente historicamente construído sob um invólucro de privacidade e aconchego. Sem fazermos juízos de valor se essa privacidade é positiva ou negativa o fato é que cada comunidade-prédio tem um signficado e sem reflexões sobre seu conteúdo fica difícil de dimensionarmos o que representa segurança para uma comunidade em abstrato. Entretanto é possível afirmar que se crescem o número de catracas (em abstrato, independente da qualidade dos prédios que elas foram implantadas) cresce o valor da segurança e diminui o do chamado caráter público.
Vale lembrar que esse caráter público congrega muito além do simples direito de circulação de pessoas por aquele prédio, mas como o seu direito de manifestação nele e seu convívio com os habitantes cotidianos que ali desempenham papéis ou funções. Se fazemos a escolha por determinar menos público um espaço a noção de exclusão daquela experiência está implícita, mesmo que a exclusão não seja propriamente sentida na mente do excluído (uma pessoa que não tem o crachá para entrar num prédio de escritórios está excluída da experiência de estar lá dentro, mesmo que não queira estar).
O debate sobre o controle tem genealogia acadêmica longuíssima e aqui não vale a pena lembrar todas as acepções teóricas dessa palavra; o que cabe expor nesse caso é que aumentando o controle queremos em alguma medida aumentar a eficiência de algum processo, especialmente de produção, e, em decorrência casada temos o aumento da dominação que se impõe dos condutores sobre os conduzidos dentro do próprio funcionamento da produção, por exemplo. Nem sempre a eficiência aumenta, mas é certo que a dominação sim. Dominação dos que tiveram o poder de decisão de instalar a catraca em relação àqueles que foram submetidos à ela; da vida que acontece naquele meio; dos papéis que ali são distribuídos; e, porquê não, dominação demonstrada e explícita de um pequeno território, privado do convívio do público. Aí localizamos uma relação de poder, de autoridade, apesar de todos estarem submetidos ao próprio controle.

Na universidade. Na faculdade.
Toda instituição de ensino é influenciada por sua arquitetura. O espaço físico, a disposição professor-aluno (ou educador-educando) media a educação tanto quanto a qualidade dos colegas de classe, a linguagem e a didática do professor e seus recursos, mesmo que de sua maneira peculiar. O ponto é que se pensarmos que numa arquitetura na qual, de alguma maneira, forma segue a função, uma faculdade que busca cumprir a função de produção do conhecimento de uma maneira determinada terá também a sua forma determinada por essa maneira de desempenho de sua função concedida por definição. Uma universidade que cumpre um papel de formação mais multidisciplinar será aquela que também consiga promover uma integração espacial entre os prédios dos cursos e que consiga que o corpo discente migre de um para o outro, montando seu próprio currículo, por exemplo. O espaço e seu uso não é determinante, mas ajuda, condiciona, revela e cria terrenos férteis para diversas atitudes pedagógicas. O contrário também ocorre - conseguimos muitas vezes diagnosticar no espaço tendências nas transformações destas atitudes.
Tendo isso em vista percebemos que o impacto da instalação de catracas numa faculdade (pública!), para além de trazer com força as reflexões particulares sobre o significado da catracalização (ironicamente tema da redação da FUVEST2005) dos espaços, nos deixa também o debate sobre a função da universidade pública e da produção do conhecimento científico e sobre o direito à educação.

prossegue no próximo post.

segunda-feira, agosto 04, 2008

Gente, tenho certeza absoluta que tá bem chato "acompanhar" o Palavras. Isso é ruim por que depois que a gente desacostuma de acessar um blog acessá-lo de novo é muito difícil, é que nem retomar um hábito. De qualquer maneira lá vai o Chico, depois de alguns meses, retomar as postagens. Estou com a meta de pelo menos um texto, texto sim, por semana. Acho que eu consigo.

36.


Nossa satisfação quando eles são punidos
Prazer e degustação de algemas

Quando um cara pobre é preso pessoas existem aquelas pessoas que falam "bem feito, vagabundo", existem aquelas outras que agradecem a Deus, existem ainda outras que gritam "bandido", aquelas que ficam com pena e ainda outras que, numa análise da conjuntura do Brasil, pensam o quanto aquela prisão representa a criminalização da pobreza, o controle de massas, do proletariado urbano subempregado, independente de sua culpa. É, na minha opinião, uma análise coerente. Faz sentido pra mim. Além disso geralmente quem tem esse discurso fala em garantias, em direitos que aquela pessoa têm e que deve ser respeitados, sua dignidade etc.
A pergunta de hoje é: e quando um Daniel Dantas, corrupto-rico-branco-e-banqueiro, é preso? Não acho que a importância da situação do Daniel seja superior à do Fulano, do Cicrano ou do Beltrano que foram presos conforme o descrito no primeiro parágrado. As garantias devem ser as mesmas, isso eu não vou nem tocar. E também não vou nem entrar no debate de que o Daniel vai ser privilegiado no acesso à justiça e à essas garantias. Ele vai. Vai ser privilegiado, vai ser prioridade, vai ser julgado primeiro e inocente. Vai pedir um "abreoscorpus" e o presidente do Supremo Tribunal Federal, homem do Judiciário brasileiro, vai conceder e vai passar por cima de todo mundo pra isso. Isso, também não quero me alongar aqui, vai acontecer, por óbvio, por que o Dani é branco, rico e banqueiro.
Mas voltemos à pergunta. Quando o Dani é preso, o que sentimos? Se eu acho mais coerente fazer aquela análise sistêmica quando aquele outro é preso posso fazê-la também com o caso do nosso amigo aqui. Sim, ele é um banqueiro que aproveita de sua situação financeira para viver fora dos limites do insuficiente estado democrático burguês, burlando mesmo a lei que é feita para lhe privilegiar. Ele é um dos sócios do capital transnacional que está se lixando para a desigualdade social brasileira ou para nossa legislação ambiental. É bom que ele seja pego, que ele pare de fazer o que faz, mesmo que seja por alguns dias? É bom que ele seja impedido de ser 10% o que ele é? Na minha opinião sim.
Tá, mas até agora eu não falei nada que seja original ou que alguém já não houvesse falado antes. Calma, vou achar ainda o ponto.
Dadas as situações expostas eu irei além perguntar o que efetivamente sentimos e desejamos em relação aos dois personagens da nossa história, o amigo do primeiro parágrado e o Dani.
Pelo primeiro sinto, e falo por mim, um sentimento que acho que deriva daquela análise que eu falei. Não sinto pena, não, mas acho que indignação por conta do que a sua prisão representa no país onde vivemos, para sua família e para sua comunidade. Acho uma bosta que ele seja preso, ele ter tido uma vida que lhe deixou como opção dentre as suas escolhas uma ação que resultará em uma temporada de maus-tratos e a entrada para um mundo onde não existem direitos, onde ele não será nem de longe um cidadão. Para ele defendo um direito penal mínimo, que puna com o objetivo de fazer com que essa pessoa pense sobre seus atos e adquira consciência sobre o mal que fez, se é que ela efetivamente o fez. Além disso, é claro, esse direito penal mínimo incluído em todo um contexto onde o nosso amigo poderá voltar pra casa e ter em seus possíveis caminhos atalhos melhores e mais dignos dos que rumou.
E o Dani? O que sinto no fundo quando ele é preso? O que sentem as pessoas que partilham de minha análise? Feliz? Regojizo-me em ver o carequinha com algemas ou o Pitta saindo de sua casa de pijama? Para eles defendemos o direito penal mínimo? Admito que a primeira vez que eu vi ele sendo preso eu fiquei feliz, num tava nem aí. "Que bom que esse desgraçado que vive sem limites agora tem um, o da lei" - nessa hora eu parei subitamente esse meu pensamento e meta-pensei: "Calma, você viu/ouviu o que você acabou de pensar?".
"Esse desgraçado que vive sem limites agora tem um, o da lei". Se essa frase fosse dita para o cara do primeiro caso... se esse sentimento de vingança, de prazer, tivesse lugar na primeira situação e eu me visse dizendo ou pensando isso eu me acharia um dos seres mais cruéis ao sul do Equador - por que a recíproca não é verdadeira? Eu sei que as formas não são livres de seus conteúdos e que as duas situações são diferentes, mas no limite, são prisões. Quer dizer que a lei dura e que prende eu reservo só pra um dos segmentos da população, o mais privilegiado? Pior que isso, por que a lei é só o meio do caminho: será que a sede de sangue, a satisfação por ver algemas eu só tenho (de qualquer jeito, tenho) quando eu vejo as algemas nos pulsos ao lado de um Rolex? Eu não sou contra leis que criam desigualdades, não. Cotas, por exemplo, eu acho que fazem sentido, ou mesmo aquelas leis que protegem as mulheres, a diversidade sexual ou outras minorias oprimidas. A questão é se essa desigualdade faz sentido e se esse sentimento de vingança é saudável, compatível com a minha visão de mundo e com meu projeto de país e de sociedade.
Então, não é. Repensando percebi como pouco faz sentido um sentimento desses no mundo que eu quero, ou na construção do mundo que eu quero. A lei deve ser dura com o Daniel Dantas sim, não tenho dúvidas disso, mas ela não pode deixar de impedir ou lutar contra um sentimento desses, por que quem mais se aproveita dele não é o esfomeado da esquina, mas sim o bem-satisfeito do Fasano, srs. Frias, Marinho e Mesquita, que favorecem e protegem os srs. Setúbal, Ermínio de Moraes e, por que não, Dantas, que são sócios minoritários dos fundos ou consórcios transnacionais trilhardários sem nome. Esse sentimento não só faz vender o jornal, mas como desvia a noção do todo para a noção do particular, permite ao patrão reclamar da corrupção ao lado do empregado ao mesmo tempo que ele o manda sonegar algumas notinhas.
Esse desvio da atenção ao todo para a atenção ao particular é muito perigoso. Nos sentirmos felizes com a prisão do Daniel é, para além de bobo, infantil e meio cruel, uma enorme burrice porque depois de preso ele virará um ótimo exemplo de banqueiro corrupto, condenado pelos preocupados banqueiros bonzinhos, que sustentam os jornais-e-revistas-e-tvs-de circulação nacional que apontam-lhe o dedo e discutem se ele deve ou não ser submetido ao uso de algemas. Perde-se a noção que os bonzinhos são tão responsáveis pelo amigo do primeiro parágrafo ser preso e que ficar feliz e comemorar as algemas novas do Dani é esquecer que, além das algemas não serem uma coisa legal para se punir as pessoas, independente elas quem forem, os crimes que ele cometeu não são o cerne da questão social brasileira, da desigualdade, da miséria e da pobreza.
O que eu estou querendo dizer é que esse sentimento não tem ou não deve ter lugar quando pensamos o ideal e que as análises das situações, mesmo em mesas de bar, devem passar longe dele. Repetindo-o ou usando-o propagamos um senso comum manco que, além de anti-garantias, maqueará o verdadeiro problema, que existem Daniéis Dantas pelo Brasil que conseguem tudo o que ele consegue e não são presos e que ainda outros nem precisam fazer o que ele fez para explorar os trabalhadores que residem nos enormes bolsões de favelas nas periferias das grandes metrópoles.
O verdadeiro problema do Brasil, para ser percebido, passa por começarmos a falar mais do todo e menos do particular.

quinta-feira, junho 12, 2008

É claro que um dos meu grandes assuntos de ultimamente tem sido o do Fórum da Esquerda. Sim, eu tenho falado muito politico-estudantês nos últimos tempos, o que se é bom por um lado, é estranho por outro. Algumas palavras do jargão do movimento estudantil acabam pegando na gente, e pouco a pouco padronizando e homogeneizando as idéias e a linguagem de um grupo. Por isso as férias são boas, pra dar um frescor de individualidade quando o grupo volta e pra nós mesmos.
Já pensei em uns trocentos assuntos nesses últimos dois meses, a questão maior é que faltou tempo para escrever - sentar a bunda e escrever. E nem é preguiça!
Espero muito poder escrever mais agora em julho, explicitar algumas de minhas angústias. O XI, o centro de São Paulo, o Direito. Tudo isso fica orbitando minha cuca, mas acabo não falando de nada.
Boas férias, amigos.

quinta-feira, maio 29, 2008

Rápidas XIV
A. Uspianos de todo o mundo - uni-vos! (III)
É, pessoal, o V Congresso da Universidade de São Paulo foi inviabilizado pelas manhas autoritárias da reitora. Deixando a decisão de liberar ou não os funcionários às unidades a altaburocracia universitária deu um tiro fatal no evento que pretendia discutir a "Universidade que Queremos". Por mais que seja possível criticar a posição irredutível do Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP) de se retirar é necessário que nos solidarizemos com os funcionários, sacaneados, que ainda haviam se proposto a manter os serviços essenciais dos campi, como circular e bandeijão.
Também não é animadora a posição adotada pelo ME na Assembléia do dia 26/05, mas acho inútil colocarmos a culpa disso em grupo X, Y ou Z que é "aparelhado" por "partideco" A, B ou C - o problema foi do movimento, que dissolveu a estrutura montada para o Congresso e adotou um calendário confuso de uma tal "Jornada de Lutas". A questão é: se esse é a único espaço no qual a Universidade tá sendo discutida nós temos que participar.
B. Novidades
Acho que vou poder me dedicar mais à manutenção e à produção cá aqui no Palavras. Estou me demitindo do emprego, pra poder levar melhor a Faculdade.

quinta-feira, maio 22, 2008

Rápidas XIII

A. Uspiano de todo o mundo - uni-vos! (II)
O V Congresso da USP já é semana que vem - é hora de discutirmos a nossa Universidade. Não deixem de participar! É fundamental estar lá a par das discussões e se mobilizando se quiseremos realmente transformar a USP da elite cafeeira da década de 30 na USP popular do século XXI.
Aliás, o evento sobre Universidade Popular que anunciei no mural foi um sucesso; agradeço a todos que compareceram. Desde a palestra do profº Zé Geraldo, passando pelos GTs e finalizando no painel de movimentos sociais conseguimos iniciar a discussão sobre a "Universidade que queremos".
A chapa "Universidade em Pauta", da qual fiz parte, conseguiu 53% na São Francisco, levando, assim, 4 delegados para o Congresso.

B. Marasmo palavrasdeordeniano
É, eu sei, a produção do Palavras já foi mais intensa. Mas é questão de tempo. A vontade de escrever vai e vem sem motivo aparente.

quinta-feira, maio 08, 2008

Mural de Eventos PdO 1ªed.

Segue convite para evento organizado na Faculdade de Direito da USP. Qualquer coisa meu email, vocês sabem, é fbritocruz@gmail.com.


Universidade Popular

13 e 14 de maio na Faculdade de Direito USP

Um projeto diferente de Universidade

Perplexos com o quadro de extrema exclusão da universidade pública brasileira e esperançosos com a chegada do V Congresso da USP, não podemos deixar de nos perguntar: qual é a Universidade que queremos, afinal?
Na busca de contribuir para essa discussão, os coletivos Dandara, Fórum da Esquerda e SAJU trazem à FDUSP nos dias 13 e 14 de maio a defesa de um projeto popular de Universidade.
Como estudantes de uma Universidade pública, cabe a todos e todas nós realizar reflexões como essas e levá-las para momentos de construção e de luta, como o V Congresso da USP.
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13.05
19h: “O que é Universidade Popular?” – Palestra com o professor José Geraldo de Sousa Junior (Direito - UnB)
Debatedores: professores Celso Campilongo e Diogo Coutinho


Contando com a participação de José Geraldo de Sousa Junior, professor da UnB e membro do Núcleo de Estudos para a Paz e Direitos Humanos, este evento buscará pautar, a partir de um observador crítico de dentro da academia, a importância dos movimentos sociais como atores jurídico-políticos e o papel Universidade neste contexto.

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14.05
Grupos de trabalho
9h: “Ensino, pesquisa e extensão” com a professora Ana Lúcia Pastore Schritzmeyer (FFLCH-USP)
11h: “Fundações e financiamento”

Neste momento, nos debruçaremos sobre dois dos temas eleitos como eixos do V Congresso.

19h: “Os movimentos sociais em defesa da Universidade Popular” contribuições do MST, Educafro e Universidade Zumbi de Palmares
Para a construção verdadeira desse projeto popular de universidade, não podemos deixar de dar voz àqueles que estão de fora, querem e têm o direito de entrar.

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Esse evento faz parte do calendário de preparação para o V Congresso da USP, momento em que funcionários, professores e estudantes pararão a USP para refletirem sobre “A Universidade que temos e a Universidade que queremos”.
Em representação paritária as categorias discutirão seis eixos temáticos, são eles:

1. Educação e Conjuntura
2. Ensino, pesquisa e exten­são
3. Fundações e financiamento
4. Estrutura de po­der/Democracia
5. Acesso, permanência e ex­pansão de vagas
6. Organização da luta unifi­cada após o Congresso

Local: Sala dos Estudantes da FDUSP – Largo São Francisco, 95

Coletivo Dandara Fórum da EsquerdaTransgredindo a Indiferença! Serviço de Assessoria Jurídica Universitária – SAJU USP

segunda-feira, abril 28, 2008

Rápidas XII

A.  Uspianos de todo o mundo - uni-vos!
O V Congresso da USP vem chegando aí para unir as lutas das 3 categorias da Universidade. Os eixos temáticos "Educação e conjuntura", "Fundações e financiamento", "Ensino, pesquisa e extensão", "Acesso, permanência e expansão de vagas", "Estrutura de poder e democracia" e "Organização das lutas unificadas após o Congresso" serão pauta do Movimento Estudantil da Universidade de São Paulo durante a última semana de maio.
Vamos ficar atentos! Logo mais começa o processo eleitoral para delegados e a criação de teses!

B. Mural de Eventos do PdO
Estarei a partir dessa semana inaugurando um "mural de eventos", que é basicamente publicar convites para eventos que possam ser considerados interessantes que rolarão por aí e que eu, por intermédio do Fórum da Esquerda, organize, ajude a organizar ou fique sabendo. Em breve já posto algumas coisas...

terça-feira, abril 08, 2008

35.


Uma grande falácia perigosa

Ou como estragar o Movimento Estudantil

É interessante que na Faculdade de Direito a gente ouve muita coisa, muitos discursos meio bizarros - especialmente na chamada "política acadêmica", que é o jeito que chamam o Movimento Estudantil (ME) lá pelas Arcadas. Tem gente que prega a monarquia, tem outros que alopram geral e soltam uma publicação racista pra fazer "piada" e ainda podemos observar aqueles outros que, não tendo mais o que fazer, vão nos debates e resolvem literalmente cuspir fogo.
Claro que existem outros lados desse prisma que são mais sérios (ou que tentam ser) e que apresentam para o corpo de alunos uma proposta minimamente coesa de representação, em especial no que diz respeito à disputa política pela entidade representativa dos alunos, a saber, o Centro Acadêmico "XI de Agôsto". É rala a compreensão de que se trata de uma briga por poder, pois o conflito transcende e deve transcender o carguismo ou o oportunismo (mesmo não transcendendo às vezes) e se coloca num embate de projetos de representação e ação política perante os espaços ocupados pelos estudantes (sociedade, discussão sobre educação, ME) de Direito (debates na e da Faculdade) na USP (logo, ME da USP).
Todos esses viéses de compreensão da política estudantil encontram resposta na e da Faculdade e a influenciam e transformam de maneiras e intensidades diferentes, com orientações evidentemente diferentes. Na minha opinião algumas dessas correntes são, no mínimo, mancas e enfadonhas e, verdadeiramente, completamente tacanhas, conservadoras e subservientes à projetos de Universidade e Brasil sem compromisso com a igualdade e com a emancipação popular.

Falo especificamente de um discurso muito comum nas Arcadas caracterizado pela idéia de que o Direito pode e deve passar a ser ferramenta essencial do ME para ele se renovar perante os a atualidade e que, sendo o XI o Centro Acadêmico da Facudade de Direito, nada mais natural que esse lidere o movimento nas suas ações que encontrariam ou tentariam encontrar espaço por e pelas normas. O Direito, em todos os sentidos que cabe a expressão, transformaria a realidade e nele se daria a luta política. As leis e os procedimentos adotariam roupagem progressista e a norma seria a forma da emancipação.
Aos que pensam assim faço um desafio: que me mostrem uma situação histórica onde a mudança legal, jurídica, foi mola propulsora do movimento e da luta política e social. Provavelmente por ignorância eu vejo pouquíssimos senão nenhum exemplo. Não é possível criar regra fatalista na História sem cair em simplismos, mas é possível identificarmos tendências. O Direito não é e nunca foi meio. Ele não é e nunca deve ser fim. Ele é conquista - e só é conquista verdadeira se existem mecanismos para assim se tornar eficaz. O Direito não transforma, ele é transformado. O Direito não é sujeito transformador da sociedade, muito menos seus operadores se eles não souberem responder às demandas que a realidade traz e não se colocarem como parte dela.
Lutar pelo Direito não é fazer política "nos termos corretos" pois a política não se dá nos termos do Direito quando tratamos de vontades materiais e concretas por conquistas reais, substantivas e substanciais. O que deve ser feito pelos estudantes em sua maneira de protestar e contestar um "Estado de Direito" que muitas vezes se apresenta opressor e aliado à explorações capitalistas não está no Direito. Ele não vai dizer para que rumo temos de seguir e não é nem deve ser pauta política do movimento se tivermos compromisso com a realidade. A liberdade e a igualdade não devem se apresentar numa lógica e roupagem formal e(ou) legalista, mas de uma maneira real - até porquê só são reais se aparecem dessa maneira.
Esse jeito de pensar coloca o papel do XI como assistente jurídico externo ao ME da própria Universidade que a FD faz parte de uma cultura de distanciamento da práxis política e de ruptura com agentes transformadores e de luta que atuam na sociedade tais como movimentos sociais dos mais diversos. Esse jeito de pensar introjeta nas cabeças dos franciscanos que não fazemos parte do conflito e da construção uspiana. Subestimamos a capacidade intelectual dos outros estudantes da USP de maneira ultrajante achando que eles não sabem o que fazem e o que devem fazer.
E ainda dizem as cabecinhas protojurídicas que devemos estar um passo a frente do ME - sintomático. Para tais devemos mesmo estar um passo a frente, de preferência sem olhar pra trás para ver se ele caiu. Triste. Devemos estar do lado, em volta, na luta, na briga, no debate - nunca esnobemente na frente.
Falar que a política estudantil da Cidade Universitária é anacrônica e retrógada é recorrente nesses hermeneutas peculiares, mas não consideram como tal prática "caduca" conseguiu conquistar diversos pontos de extensa pauta numa atitude que foi feita à sua revelia e eles tiveram que tolerar pela vitória - a Ocupação da Reitoria de Abril/Maio/Junho de 2007. Paradoxal declarar que uma coisa hoje não dá mais certo se ela deu a menos de um ano atrás.
É a velha discussão do retorno do "Onze Grande". É o desejo de voltar a ser "o" CA, de estar por cima da carniça. Do XI voltar a brilhar. O XI não tem que e nem vai brilhar por estudarmos Direito. Seremos burros ao ponto de perceber que o passo a ser dado na política estudantil da São Francisco não é nos enveredar pelo caminho inútil e obtuso do Direito e sim engajar-se na construção de uma USP mais democrática, inclusiva e que responda às demandas populares?

domingo, março 30, 2008

34.



Você não está mais lá?

Não sou cinéfilo e não gosto que filmes tenham mais do que 90 minutos. Reclamo, viro cricri. Tenho memória curta e quando o filme é muito longo para mim é muito difícil relembrar o começo e dar um nó de coesão no final. Acho que eu sou bastante leigo em cinema na verdade, bastante desentendido. De qualquer maneira isso não é motivo pra eu num ver filmes e, às vezes, quando metido à besta, não é motivo pra eu dar uma palavrinha sobre eles.
Não estou lá (I'm not there), o filme de Todd Haynes que fala sobre Bob Dylan, é a bola da vez. Fui vê-lo com expectativa na parte musical e com uma expectativa bastante grande pra tentar achar ali um Bob Dylan que eu não entendo, que faz no começo de carreira "fingerpoints songs"("canções de dedos em riste", de protesto) e depois as nega, se distancia do espaço músico-político diferentemente de Joan Baez, que continuou ativista até os dias de hoje e que continuou portanto acreditanto no potencial político de uma música.
"This machine kill facists" diz o gravado no violão da anacrônica faceta de Dylan Woody Guthrie, menininho que vive fora de seu tempo e tem o nome copiado de um cantor de Blues que apodrece no hospital. É esse o argumento do filme: a máquina que mata fascistas já não passa de um violão velho, a inscrição nada mais do que uma velha marca de caneta que prenuncia uma ilusão.
A relação íntima e latente em Dylan (no filme nas suas diversas facetas) entre músicas e luta política se divide em dois momentos - o primeiro, atrelado à figura de Joan Baez, mostra o Dylan do folk music simplório, humilde e engajado, o segundo o cantor incrédulo com a ligação possível entre música e luta. Numa fala muito interessante Jude Quinn, o Dylan-fantasma interpretado por Cate Blanchett, diz:
You know, I didn't come out of some cereal box. There's no one out there who's gonna be converted by a song.(...) The songs are acts of personal conscience (...) doesn't do a damn thing except disassociate you and your audience of all the evils of the world. I refuse to be disassociate from then.
Que fala genial. Ela traz uma questão seminal a respeito da arte e da política - a visão de músicas como atos de uma consciência pessoal e que elas de nada adiantam no campo político pois dissociam o cantor e a platéia dos males do mundo é valiosa para entendermos a postura desse Dylan quando ele rompe com a tradição folk e para de compor "fingerpoints songs".
Para que compor tais músicas, qual a sua função e utilidade? De fato são símbolos, mas até que ponto não passam de jeitos de nos proclamarmos revolucionários e anti-sistêmicos e estarmos, ao mesmo tempo, deixando de lado a vivência política concreta. As músicas são jeitos bonitos de vivermos a política, líricos e extremamente cults, mas seriam momentos reais de mobilização? Essa noção de dissociação ilusória dos males do mundo é emblemática e até certo ponto representa o quadro geral da geração que Dylan fez parte - essa geração que fez o barulho maior que o Universo, mas que deixou na mão da minha geração um mundo bem diferente do pregado. É uma geração cansada. Dá a impressão de que mergulharam tão cegamente num lago muito frio e que, por sentirem muito frio mesmo, saíram poucos segundos depois. Agora não querem deixar que os filhos coloquem o pé na água gelada. O único problema é que é nesse lago que estão os peixes mais importantes a serem pescados.
Muito interessante quando o filme propõe a visão de que a visão do artista sobre sua própria obra nem sempre é compreendida e o que é esperado dele muitas vezes é algo que seu gênio não quer responder.
Acho patético artistas quererem ser aquela coisa despirocada, furacões nonsense pós-modernos, mas como recusar o fato de que a produção artística transcende sim a política formal e se embrenha em linhas mais profundas do nosso ser, ser que é político e que está situado na história, mas ser que também tem reações, emoções, sentimentos complexos e que não é e nunca será uma maquininha ou uma coisa - seja uma maquininha de trabalhar, seja de militar; seja uma coisa de trocar, ter ou venerar.
É um filme que eu fui pensando que ia tomar mil vezes Blowin' in the wind na cabeça e saí com a mesma doendo por outros motivos - porque meu ídolo parou de acreditar nas coisas que eu acredito hoje? Ele não está mais lá.



domingo, março 23, 2008

O Palavras não está desativado, amigos.
É o que queria dizer por hora. Acontece que em alguns momentos precisamos nos dedicar mais a algumas coisas e menos a outras.
Mas relaxem, eu volto em breve.

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

33.

Blogueiros e pretensiosos

Cada dia mais introjeto em minha mente a idéia de que ter um blog autônomo, de "se convidar a si próprio" para escrever numa página da web, é indissociável de uma energia pretensiosa, vulgar e em seu cerne, metida. Todos nós o somos.
Somo pretensiosos pois acreditamos tanto no nosso potencial de escrita que não temos medo de veicular nossos textos por todos os computadores lusófonos do mundo. Somos metidos pois cremos que o que escrevemos é válido para ser lido por todos os usuários dessas máquinas. Somos vulgares pois colocamos nosso pensamento estritamente pessoal no rio de informações bíticas que corre no espaço virtual público, sem formalidades.
Discordo a priori que isso seja um grande avanço. Não o é. Não adianta gritarmos ao quatro cantos do mundo se já houver um amigo no quarto canto que tem um vizinho que grita a mesma coisa. De nada serve expressarmos livremente e democraticamente nossas opiniões se essas são efetivamente vulgares, vulgatas, menores, pessoais.
Temos a ilusão, e já abordei isso quando falei do Xingu virtual, de que todos falamos a mesma língua, afinal todos nós somos índios da tribo dos blogueiros - mentira. Um índio ianomami é igual a um nativo aborígene? Um bororo é igual a um munduruku? Evidentemente não. As linguagens são completamente diferentes e por aí vai.
Tendo em vista essa ilusão e nossa pretensão e vulgaridade coloco a minha questão chave. Somos todos piruá. Ideólogos, escritores, jornalistas, cronistas etc - piruás disso. Sabem o que é piruá? É o milho que mesmo depois de passar pela panela não virou pipoca. Tinha tudo pra ser pipoca, mas não foi.
Blá-blá-blá. Mas isso é evidente, imbecil!
É eu sei que é. Só disse isso tudo pra falar uma coisa: "Baixemos a crista. Todos. Eu inclusive, e, talvez, principalmente". Não são só reflexões palavradeordenianas, são reflexões necessárias. Sem elas não conseguiria andar para frente.

quarta-feira, fevereiro 13, 2008

Rápidas XI

1. Corra que a polícia vem aí
E como eu já disse os policiais da gramática, seres mais chatos do mundo, rondam o palavras e reclamam nas minhas costas que minha escrita é repleta de erros. É mesmo. Eu não faço revisão, não tenho saco, e também não tenho saco de ficar me policiando quando sei que isso não passa de frescura. Se alguém não entendesse o que eu quero dizer aqui por que tava errado é uma coisa - outra muito diferente é ficar de frescurite aguda tentando achar defeitinho no que os outros escrevem. Já estou um pouco farto dessa história. Sei que meus protestos são inúteis, mas não consigo calar-me.

2. Só Obama?
Muito interessante um candidato símbolo de resistência e vitória de um povo oprimido ganhar ou ter chances de ganhar as eleições estadunidenses. E não seria mais legal se o candidato(a) fosse símbolo de dois segmentos oprimidos?

3. Em breve
Notícias do Largo de São Francisco e o começo do ano político. Juro que sai algo do gênero.

sexta-feira, fevereiro 08, 2008



Não, isso não é um xouóf de cultura. Essa é uma das únicas coisas que eu conheço de Tchaikovsky. Só coloquei para movimentar um pouco esse marasmo. É muito bonito.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

Rápidas X

1. Lembrete
O texto n°32, só para lembrar, é "bastante" antigo se comparado à todos os outros. Resolvi lembrar isso mais por achar que isso teria que ficar bem claro tal como o porquê de postá-lo. É um momento que o pensamento estava em sua fase de desenvolvimento mais inicial.

2. Novos rumos?
Chegou em mim a notícia que o colégio contratou um renomado arquiteto italiano para cuidar de sua programação visual-arquitetônica-espacial, depois dos seguidos golpes de picareta desferidos por engenheiros bem-intencionados contra a obra de Tibau.

3. De volta ao Largo em breve
E daqui a alguns dias voltarei às aulas com novo ânimo e com novos calouros. E com novíssimos assuntos.

terça-feira, janeiro 15, 2008

32.

Antiguidades I
Tive uma idéia legal. Vou colocar aqui escritos embrionários pré-PdO, datados do 1º semestre de 2006. Acho que eles propõe uma discussão muito delimitada do problema santacruzense, mas para mim, especialmente para mim, claro, são interessantes para clarificar a evolução de um pensamento em relação ao colégio numa linha contínua. Lá vão eles.

A Ruína do CSC

Eu e o Santa Cruz

Há 10 anos eu estudo no colégio que todos estamos. Desde a primeira série do Ensino Fundamental 1 o Santa Cruz é a minha casa, minha rotina. É engraçado quando se olha para trás e tudo o que já se fez se passa no mesmo cenário, absolutamente tudo – os primeiros amigos, os melhores amigos, as maiores emoções, as maiores tristezas, as mais profundas angústias e as mais incríveis alegrias – tudo no mesmo palco, o Colégio Santa Cruz.
Acho que é por isso que, similarmente com diversas pessoas, o Santa não é um colégio, aliás, é um colégio que não é para estudar. Nosso colégio é e sempre foi um local de discussão e de formação em todos os sentidos de uma elite, sim elite, pensante e preocupada com o nosso país, o Brasil. Aqui o desafio é, como informa o Plano Diretor de 2005, formar um ser humano integralmente. E o que seria um ser humano formado integralmente? Alguém com Inteligência, tanto emocional quanto racional? Ética? Lealdade? Caráter? Alguém religioso? Espiritual? Feliz? Ou talvez tudo isso junto? De acordo com o que está no que podemos chamar de bíblia santa-cruzense, o Plano Diretor, um homem integralmente formado é aquele que é educado com um conceito generalizador e um ideal de humanidade.

O PD e o Ideário proposto

Seguindo mais adiante no texto que expõe o ideário da escola, na página 7 do PD 2005, o autor prossegue: “A formação humanista ainda hoje pressupõe o homem integral: a educação deve-se dirigir ao conhecimento, á conduta ética e à atitude interior. Nenhuma dessas dimensões nasce ao acaso: são produtos de uma orientação coerente por parte do educador e de uma disciplina consciente por parte do educando”.Mais adiante ainda diz que essa estrutura pedagógica, rotulada como humanismo, vem se ajustando desde a fundação do colégio há 54 anos nos moldes das mudanças sociais e temporais que essas décadas proporcionam.
Mas aonde quero chegar citando o PD e a minha história no Colégio Santa Cruz? Agora sou um aluno que começa a acabar o curso completo do colégio. Já passei por todas as etapas e já me foi dito, principalmente no ano do aniversário de 50 anos do Santa, que a filosofia do Pde. Charbonneau e do Pde. Corbeil, a filosofia chamada humanista, continuava, se perpetuava. A criação de um espaço de desenvolvimento das todas as potencialidades positivas humanas, como é dito no início do PD era certa, estava ali, nos gramados, nas salas de aula e no mundo que é o Colégio.


O(s) Problema(s)

O problema, e é aí que eu quero chegar, é que coisas vem acontecendo que não são propriamente corretas e interessantes a esse cenário, a esse espaço de idéias e a esse espaço físico, arquitetônico. Uma série de fatores me faz tirar tal conclusão, e digo com a propriedade de quem já viu o Santa Cruz dos campinhos de terra, sem o CEI, com a antiga biblioteca e sem o teatro. O que digo não pode ser encarado como uma análise pedagógica tanto do curso como do colégio em si, até porque eu não tenho diploma nem cacife para bancar tal análise, nem mesmo as pessoas a quem critico devem achar que duvido da capacidade ou do jeito certamente superior com que lidam e lideram a instituição. Analisarei fatos recentes, pressões recentes, atitudes, e tirarei algumas conclusões sobre tais itens, sem encarar os pedagogicamente, até por que penso que não é de maneira alguma no corpo docente que reside o problema.

1º.

Primeiramente falo de algo físico, que todos vemos – e sentimos. Falo de obras no colégio. Todos nos acostumamos, desde a primeira série, a pensar quais obras o colégio iria fazer nas férias. Campo society, biblioteca nova, CEI do Ensino Médio e várias outras novidades nos atingiram positivamente nestes anos de estudo e de convívio, e sempre após as férias. E então, praticamente do nada também, surgem imposições no espaço totalmente opostas às positivas, praticamente monumentos contrários aos edifícios que lá estão erigidos. Os toldos de plástico instalados no prédio do colegial são um exemplo dessa conduta arquitetônica, que penso que deve se alastrar para as outras instalações. Chamados por alguns de “Estufa de Alunos” aqueles toldos retiram parte de toda a amplitude e de toda a sensação de liberdade do pátio do colegial. Certamente o arquiteto que projetou o próprio edifício imaginou todo o funcionamento perfeito dos elementos contidos ali: a rampa, os pátios, a ponte, as salas de aula e os corredores. Todos os aparelhos que, em minha opinião, refletem muito do que é o Santa Cruz – a subida da rampa no primeiro dia de aula no colegial, olhar da escada do 2° colegial para o espaço diante da nova cantina (por sinal uma obra que valoriza, essa sim, o espaço do colegial) são coisas, emoções, que ao mesmo tempo junto a todo o espaço proporcionam uma sensação de liberdade, de acolhimento e de juventude. E então alguém vem e instala algo como para pressionar os alunos, um aquário, um laboratório de testes – em minha interpretação como numa estufa, uma gaiola para melhoria de rendimento.
Além da questão da interpretação do algo físico me vem a simples questão do “para que serve?” Que realmente faz sentido. Ninguém até agora conseguiu explicar-me os motivos de instalação do toldo – me deram algumas hipóteses – como o som, a chuva entre outros. Mas digo, existem outras soluções além daquilo, com absoluta certeza, pois os toldos não passam de uma espécie de remendo, uma intervenção no mínimo barulhenta e espalhafatosa – no mínimo. Por que o colégio não contrata um arquiteto para pensar nesses espaços? E se contrata – sem questionar a capacidade – mas por que não um grande arquiteto, ideologicamente compatível com a escola e de peso tanto no meio dos profissionais quanto fora. É de não se entender, de se lamentar. O Colégio Santa Cruz, renomado e dito um dos melhores do país, ter um espaço tão formidável sendo depravado com obras no estilo “serve e é barato”. “A forma segue a função” alguns também dizem – se é assim, qual é a função dos toldos? Nenhum aluno, ou até mesmo professor, sabe.
Já citei que este é um exemplo de degradação, ou propriamente decadência, do espaço do colégio. O que vem por trás disso?

2º.

O próximo tema é bem recente: a proibição sumária do truco. Antes de expor minhas idéias gostaria de mencionar que nunca participei de nenhum campeonato de recreio de truco e nunca fui um jogador assíduo. Eu não sei quais foram as razões para tal proibição de verdade, mas o problema não está aí.
O colégio sempre teve a política de discutir com os alunos os problemas, como numa relação familiar saudável. Nas aulas de OE discutimos por diversas vezes drogas, sexo e escolha profissional, além de diversos problemas aluno-escola, e creio que demos resposta à maioria dos problemas. E então, praticamente do nada, a escola proíbe uma atividade lícita, recreativa e inofensiva. O que ocorreu? Foi nos dito que a situação tenha perdido o controle, que a direção achou melhor cortar o mal pela raiz pois este jogo – o baralho – é uma atividade de azar. Mas então pensei eu: onde estão as antigas discussões? Qual é o papel do aluno nessa situação (que é nova, pois estamos acostumados a debater as nossas idéias)? Devemos parar e obedecer cegamente sem questionar o por que? Não falo de liberdade e sim de coesão. Se a escola escolhe proibir jogos de azar devia também suspender atividades como o bingo e a rifa em suas festas beneficentes, não deveria?
A atitude que a escola tomou, pela primeira vez, foi a de um pai autoritário, totalitário e, sobretudo, dominador. Se faz tanto sentido retirar o baralho da lista de atividades permitidas acho que todos, pelo menos uma parcela, entenderia, compreenderia que a atitude é necessária. E então, mais uma vez, me pergunto: de onde saiu essa mudança de conduta? Quem ou o que efetivamente causou a proibição do baralho?

3º.

Prosseguindo em meus temas agora abordarei algo muito maior do que um fato interno como a tal proibição de jogos de baralho. Algo que vem de certa maneira se aproximando. A nova unidade do Colégio Santa Cruz já estava para sair faz alguns anos e nesses últimos meses vimos no jornal uma matéria estampada com o projeto arquitetônico do local, assinado pelo renomado escritório UNA. A unidade será bilíngüe as aulas em período integral – estilo americano ou britânico, dependendo da visão.
Vemos então que claramente a tal escola seguirá os moldes de outros colégios bilíngües elitistas que vemos por aí. Colégios estes que primam a sua qualidade e capacitam os jovens dessa elite para esse novo mundo globalizado. Lá pode-se aprender tudo que é necessário para fazer a graduação universitária ou a carreira fora do nosso país, ganhando novas fronteiras. Enfim, aprende-se a lidar com o capitalismo financeiro globalizado, despontar nele.
Mas aí vemos a contradição, mais uma vez. Como desenvolver uma elite extremamente ligada a uma cultura estrangeira e individualmente capitalista que fosse ao mesmo tempo voltada também ao nosso país? Como pensar como um grande empresário multinacional e individualista e simultaneamente como um membro de uma elite consciente e, sobretudo, próxima aos problemas do próprio país? É impossível. As idéias do “novo” Santa Cruz não se encaixam com as do “antigo”. É tudo completamente diferente, contrastante: uma elite extremamente preparada para a prática do capitalismo financeiro de maneira global (ou até mesmo essencialmente primeiro-mundista) e outra, teoricamente desenvolvida para além de ser elite também pensar sobre em que as suas ações podem implicar, fundamentalmente também considerando o resto da população de seu país – que, sinto dizer, é muito necessitada.
Esse confronto de idéias de duas elites resulta numa impossibilidade desse novo Santa Cruz existir sem a modificação do antigo. Porque a nova unidade será “Santa Cruz” se tem idéias tão diferentes das da antiga unidade? A Congregação, órgão dono de ambos as instituições (ou seria uma só) poderia dar outro nome a esse novo colégio, pensado de maneira e em situação tão diferente – como existem outros colégios da própria que levam, junto a uma estrutura pedagógica diferente, um nome diferente também.
O que ocorre neste caso é que “Santa Cruz” não é mais um simples nome. “Santa Cruz” agora é uma marca, uma marca a ser vendida. A nova unidade leva o nome do antigo colégio fundado por Charbonneau pois esse agora é um ícone das elites paulistanas e um objeto de desejo.
Planejada exatamente para um setor da população – essa mega-elite que deseja exportar suas mentes em troca de primeiro mundo – a nova unidade tem um excelente planejamento, tanto de marketing como de todos os fatores para desenvolver um negócio, uma empresa, com segurança e rentabilidade. Projeto moderninho, estrutura bilíngüe e integral – copiando estruturas estrangeiras, nome. Todas essas coisas fazem dessa nova unidade um sucesso certo. O colégio terá a fusão de uma estrutura intelectual (a da antiga unidade) com uma mais “preparada” para a vida. Sucesso profissional certo para o aluno – preenchimento certo de vaga para a escola, que cobrará o que quiser, pois que não quer que o filho desponte nesse competitivo mundo?
Tudo isso me incomoda muito. A capitalização, sim, capitalização do nome do Colégio Santa Cruz certamente não seria muito apreciada pelos seus fundadores. Essa instituição não visa lucro, a princípio, mas então o que ela visa? De onde veio tudo isso? Perguntas como essas se multiplicam de várias maneiras: para aonde vai o lucro da nova unidade? Quem teve a idéia? Por que isso agora? O que acontecerá com a antiga unidade? Tudo isso e muito mais – questões essas que ficarão em minha mente. Aonde o Colégio Santa Cruz vai parar?

Perguntas sem respostas

Penso se tudo isso não seria uma certa pressão dos pais no próprio colégio, mas então penso como o próprio nunca cedeu em relação aos mesmos. O vestibular e a necessidade de cursar uma excelente universidade são preocupações óbvias dos pais, mas pergunto se são também do colégio, e pergunto também o projeto inicial era esse.
Os pais certamente têm todo o direito de tomar a dianteira na educação dos filhos, mas acho que daí para fazer o seu próprio colégio distorcendo toda uma estrutura planejada previamente é de certa forma uma atitude extremamente negativa. Quem são esses pais e quais são seus objetivos quanto ao colégio?
Busco respostas ou ao menos alguém para continuar pensando comigo. Quem sairá do colégio pode pensar “mas eu já estou saindo mesmo...” mas então penso: “em que tipo de escola você quer que seu filho estude?”.