Palavras de Ordem – Anexo-Manifesto:
Reflexões e soluções para o Grêmio
O Grêmio Estudantil do Santa Cruz é uma grande desilusão, isto é, por mais clichê que seja, fato. Quem entra vê que o mecanismo não funciona. As discussões não andam, a burocracia emperra. Digo que acho dificílimo começar por lá “a” alguma coisinha, “a” drummondiana[1] florzinha anti-euclidiana surgindo do pelas brechas do asfaltos – minhas esperanças se esgotaram. O protesto, o conflito de autoridade com a escola, natural por muitos anos, não existe mais. Hoje temos uma instituição submissa aos interesses de terceiros, da direção. Não digo que a direção queira exercer este poder, não sei disso na verdade, mas que exerce, exerce. Atualmente o Grêmio não faz nada sem a aprovação da direção, nada. Não há independência, iniciativa, fatores obviamente necessários para ser construído um agrupamento ativo defensor dos mais primários interesses dos estudantes e símbolo de uma juventude consciente. Sendo esta juventude rara, como já expliquei, a instituição cai em descaso, entra em ruína.
O Grêmio foi importante? Puxa, mas é claro que foi! É claro! O papel de protesto da simples existência de uma coletividade numa época como a famigerada ditadura militar foi essencial. Mas dissemos bem – “foi”.
O que é essa “instituição” hoje? Nada mais do que dez, quinze, gatos pingados que aparecem sem muita vontade (na maioria das vezes) numa reunião vazia, para não dizer falida, ora para discutir assuntos ou de extrema futilidade ora para debater sobre temas que apesar de terem relação com toda essa discussão a respeito da escola não terão uma incidência minimamente proporcional à sua importância além de estarem sempre amarrados a conversas sem compromisso e sem embasamento.
Acho um tanto monstruosa e desengonçada nossa representação como alunos junto à direção, o Grêmio. Não significa nada para o “grosso” dos alunos do que algumas músicas no recreio, um mural, uma festa e um bando de “comunas” chatos que ficam enchendo o saco. Querendo ou não, romantizando ou não, o Grêmio Estudantil do Colégio Santa Cruz é isso hoje.
É um pouco romântico mesmo achar que é essa aberração burocrática, que é essa máquina-monstra, controlada por uma oligarquia muito particular e reservada, que deve ou que vai mudar alguma coisa. Oligarquia sim, “elite” até. Um pequeno grupo de pessoas que de uma maneira ou outra ascendendo ao “poder” e representando todo o corpo estudantil de forma aleijada, capenga e insuficiente. Eles (eu até posso me incluir nessa oligarquia, não nego o que já fiz) pensam por nós. Eles resolvem. Eles nem resolvem, mas gostam... deixa...
E é assim que a coisa acaba sendo levada. Com a pança, com a barriga. Instrumento de controle muito eficiente esse Grêmio – brinquedinho dos “cultos”, dos emocionalmente carentes e dos ingênuos idealistas desavisados e “saco de pancadas” da massa geral conformada que quer “levar a sua vida pra frente” sem ter de pensar em coisas chatas como o Grêmio porque este já é, mesmo antes de ser conhecido, construído por um senso comum infalível como sendo uma coisa primordialmente imbecil, idiota e inútil.
Creio que o Grêmio tem de se admitir. As pessoas que o fazem e que o farão devem, se buscam o bem-estar do corpo estudantil santa-cruzense, retirar da sua visão toda essa casca de romantismo. Talvez seja melhor e inevitável a vitória de uma chapa menos preocupada com a consciência do corpo. O Grêmio, penso eu, deve se resignar à sua insignificância quanto à construção do senso crítico. O aparelho burocrático desengonçado, as conversas corta-barato com os representantes da direção, as reuniões sem rumo revelam o nonsense do monstro gremista.
Não digo aqui que não deve haver as festas ou músicas no recreio mas penso que as coisas podem ser realizadas com tranqüilidade por que entende ou por quem quer mesmo. Menos reuniões, menos discussões que não levam a lugar nenhum. Se assim admitirmos a finalidade de existência do Grêmio nas questões práticas efêmeras (mas não dispensáveis) ele diminui. Não fica sobre essa instituição o peso da “Revolução” – acaba o romance.
“Mas o Grêmio É a representação dos alunos frente à direção! Se ele perder o caráter político ele perde o sentido!” diriam alguns. O fato é que o Grêmio já perdeu o sentido a tempos pois ele além de não representar a maioria já não apresenta um caráter político, esse conto-de-fadas colegial. O Grêmio hoje não passa de um brinquedinho mesmo, assim como já disse. Cultuado por um grupo e até relativamente desejado por outros mas não como instrumento de transformação ou de contestação da autoridade escolar mas como organismo de produção de lazer, de comédia, de brincadeira. Não acho que esse sentido seja ruim, seja errado, afinal ele é mais genuíno, mais verdadeiro, do que a inutilidade política mascarada que temos hoje.
A transformação e o conflito talvez devam ser oriundos da iniciativa, da representação coletiva sem nome, da conversa sem amarras burocráticas. Uma voz erguida na multidão e projetada bem alto seja, talvez, mais eficaz do que alguns sussurros ininteligíveis. É a propagação pelo exemplo. A idéia passa de cabeça para cabeça, em corrente. Se o mundo de hoje tem o elemento virtual que o usemos em favor das discussões que digam respeito à alteração deste mundo em um lugar mais justo e menos hipócrita. A afamada Infovia poderia ser percorrida por idéias menos fúteis já que ela existe e nada a fará parar de existir.
Se eu agora escrevo um texto criticando a escola amanhã um colega meu pode se sensibilizar e pintar um quadro sobre seus sentimentos em relação a ela e ao mundo em que vive. Depois de amanhã um terceiro pode se inspirar e escrever uma poesia seguida de um ensaio dez vezes mais interessante que este aqui, e, daqui a um ano, dez estudantes que normalmente se conformariam com a escola que tem hoje poderiam, ao observar estas obras, pensar um pouco mais sobre onde estão estudando. De fato é um discurso muito idealista feito por mim mas vejo mais isto acontecendo do que o Grêmio
Talvez meu discurso pareça sim um pouco conformista, de meio que se “desistir” do Grêmio político e adotar uma postura neste de simplesmente facilitar o lazer e a vida social dos seus alunos representados. Será? Na verdade penso que não: eu não estou conformado, estou indignado – até com o Grêmio.
a ser anexado em "Palavras de Ordem".
[1] "(...)
em verde, sozinha,
antieuclidiana,
uma orquídea, forma-se."
de “Áporo”, poesia de Carlos Drummond de Andrade encontrada em “A rosa do povo”, de 1945.
Um comentário:
Tenho alguns comentários e algumas estórias (uma em especial) que acho que interessam muito a você e ao seu propósito... Eu ainda não consegui ler nada do que está aqui com o devido cuidado, acredite. Minha vida está uma completa bagunça. Acho que daqui a pouco eu vou poder me dedicar um pouco a isso aqui. Como disse antes, acho que vale a pena. E não perdi o fogo, ainda, hehehe...
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