domingo, agosto 19, 2007

13.

Bom, este é outro texto que eu resolvi escrever sobre aquela bomba do início do ano. Fora de hora? Talvez. Eu senti um pedantismo no meu texto e não fui capaz de retirar, por favor relevem esta consciência.

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A hipótese do soluço cíclico do sistema

Soluço: ² (...) fenômeno reflexo que se manifesta por contração espasmódica e involuntária do diafragma, seguida de movimento de distensão e de relaxamento, pelo qual o pouco ar que a contração forçara a entrar no peito é expulso com ruído característico. (...)

Dicionário Houaiss

"As coisas precisam mudar para continuar as mesmas”

Personagem de Alan Delon em “O Leopardo” (Il Gattopardo) de Luchino Visconti (1963)

Devo admitir que tenho outra análise, outra hipótese de análise, para este caso da bomba. Esta que mostrarei neste texto se conecta e toca muitas vezes a análise feita no texto anterior, mas tem uma abordagem diferente que penso ser mais abstrata.
Tese?
"A bomba é como um soluço de um micro sistema ligado ao sistema capitalista pós-moderno – complexo? Nem tanto."
Sendo a escola, sistema doutrinário de controle e ensino, não mais que um micro-sistema, uma máquina burocrática que reproduz os princípios da ordem social capitalista pós-moderna a que serve, não vejo o dito atentado mais do que uma espécie de soluço da estrutura social que vivemos.

Um colégio é nada mais do que uma instituição que visa, de alguma maneira, preparar, moldar reproduzir um certo tipo social, que visa perpetuar nas novas gerações um determinado jeito de ver o mundo. O Santa Cruz não é diferente.

Não podemos perder de vista que o Colégio está inserido em algo e tem seu papel. Não acho que tenha gabarito para discorrer sobre o papel em si principalmente pois, como sabemos, tal texto não passa de uma mera punhetinha filosófica minha, algo que eu faço para demonstrar a vocês como eu sou bom em não agir, não fazer nada, uma postura bastante confortável de observador mas que me deixa num dilema que aqui tratei tantas vezes.

A maneira que o colégio tratou deste assunto que me fez pensar sobre tal conceito, um soluço. Dada a definição do Houaiss vemos “soluço” como um espasmo involuntário, um movimento de distensão e relaxamento que acontece sem controle para normalizar uma situação. E não é isso que vemos nesse caso? A bomba explode; uma brincadeira inconseqüente de jovens pertencentes à classe A da sociedade. A escola se vira indignada para resolver o problema dentro de si mesma usando dos aparelhos e artifícios que tem para tal matéria – desprezando formas externas à sua própria estrutura administrativa. A diretoria se recusa à discutir com os alunos (também membros da comunidade escolar) o ocorrido – feito realizado singular e voluntariamente por alguns professores independentes. Não proponho entretanto uma espécie de inquisição, uma “caça às bruxas”, este não é o ponto. O ponto é discutir com os alunos o porque um deles fez aqui não deixando isso cair em acusações chulas e totalmente desimportantes para a formação deles próprios. A realidade se põe à frente deste corpo social e me coloca uma pergunta na cabeça – seria melhor tratar isso como se não existisse e impor grades, barreiras, justamente à esta discussão? Logo essa? Esta conversa que pode, mais que tudo, começar ou continuar a construir um raciocínio de questionamento? A dúvida numa escola deve ser suprimida? Qual é o porquê disto tudo?

O Colégio trata assim por que lhe convém. É melhor tanto para o colégio reafirmar sua condição de autoridade quanto para toda a sociedade guiada pela elite paulistana continuar sendo guiada pela mesma na repetição da fórmula de sociedade que temos hoje no Brasil – desigual, injusta e maculada por uma total ausência de valores. Não interessa discutir e ensinar a criticar, muito menos se for por meio de um fato concreto, um que está perto, aqui do lado - não uma conquista lá perdida da História num século distante. Aprender a criticar e problematizar um incidente recente, um fato que se viveu, é parte do pensar pleno e humanista que a escola diz que ensina. Agora, se ela faz isso de fato é outra coisa. Já vimos em Palavras de Ordem que discurso e ação no Santa Cruz não dizem respeito à mesma coisa. Na verdade ultimamente venho pensando como definir isso e cheguei à uma boa frase: “o Santa Cruz é um colégio conservador em todos os aspectos mas tem uma complexa maquiagem de discurso que o deixa mais engolível pelas elites ‘intelectual’ e ‘econômica’”.

A bomba, reiterando, é como um soluço. Uma válvula de escape para energia do jovem que, punido eventualmente, não pensa e questiona a origem de seus atos - só muda de posição. Passa de culpado para futuro acusador. Acusador este que será pelo resto da vida – acusador de uma violência que este não percebe que faz parte. É-lhe estendido o que é certo e não há diálogo – utilizando um pouco do pensar de Paulo Freire. Neste caso há extensão e não comunicação.

É evidente que a diretoria não pensa maquiavelicamente: “hahaha, vamos manter o sistema” mas, como já diz a definição de soluço, esta se ajusta, distende e relaxa, involuntariamente, para retornar ao status quo. É bom que existam essas bombas pois trataremos elas sempre assim, desta maneira anti-dialógica e profundamente condizente com a supressão de liberdades que vemos neste aparentemente inocente colégio situado à margem do rio. Liberdade de fazer e de se engajar em qualquer ato com a carga da responsabilidade que este ato implicará. Esta liberdade verdadeira não é só a liberdade de poder matar aulas e sim a de ir e vir, de se discutir sem censura. A liberdade que vem com sinceridade e abertura frente à realidade – não com grades, físicas ou ideológicas.

Temos então, por esta hipótese de análise, a bomba como um ato benéfico para a própria elite que a critica - esta ajuda tanto a formar o papel tão importante de autoridade escolar (que por sua vez suprime o ensino dialógico e a atitude crítica) que a mesma usa para educar seus filhos (que buscarão manter a supremacia política e econômica do grupo) como por constituir uma válvula de escape para a energia transformadora do jovem – energia oriunda de suas transformações mais fisiológicas, mais anatômicas. A questão é que não quero entrar no mérito do “porquê alguém fez isso?” e sim “porque a escola veio a agir desta maneira?”.

E, assim, esperemos a próxima pois muito provavelmente ela virá.