domingo, setembro 09, 2007

17.


"A partir daí brotam obras e mais obras incompreensíveis, comparadas a quadros infantis ou mesmo pintados por elefantes prodígios. Ou uma exposição simplesmente repleta de cenas e mais cenas de sexo explícito. Porque um pouco de sexo é sempre bom.
O sexo é insistentemente usado pelos nossos estimados artistas pós-modernos. Dificilmente você vai encontrar uma exposição que não tenha uma imagem ou um texto falando desse tema tão corriqueiro. Um tema tão “revolucionário e escandaloso” agora virou corriqueiro.
Eu não me choco com sexo. Eu sou bombardeado noite e dia por sexo. Revolucionário pra mim seria justamente não falar de sexo. Seria tentar ao menos manter um mínimo de discrição sobre a sua vida sexual, ou a dos outros. Mas é claro que eu sou só um reacionário moralista que sonha com um mundo em que um artista não berre por aí as experiências que teve com conchas, travestis romenos e arroz integral.

Essa busca pelo “novo”, pelo que irá quebrar todo o sistema vigente acaba gerando um outro tipo de movimento. Um movimento em que a causa perde a importância, e que o próprio “movimento” se fortalece. Não interessa muito pelo que você luta, o importante é justamente lutar. Cria-se a “revolta pela revolta”.

E essa “revolta pela revolta” evidencia que estamos no meio de uma corrente cultural seca, simplesmente desprovida de qualquer idéia ou causa na sua base. O simples ato de rebeldia gratuita é a estrutura do contexto intelectual em que estamos inseridos. Não existe nem razão para se discutir, porque não há o que se discutir. Muitas dessas pessoas envolvidas nos pós-modernismo não têm idéia de por que estão fazendo o que estão fazendo. É preferível ao menos um estúpido que não faz nada, do que vários estúpidos que se juntam com outros estúpidos pra fazerem estupidez.
Senhoras e senhores, eis o vosso pós-modernismo: um monte de estupidez."


Começo este texto citando meu grande amigo Benjamin. Perfeita a sua colocação sobre o sexo, absolutamente perfeita, e gostaria muitíssimo de manifestar meu apoio à estas palavras que talvez tenham passado incólumes por quem leu "O Pós-Modernismo", post do próprio Benjamin.
É claro que ele e eu somos desimportantes, não entendemos nada de arte seja ela dramática, plástica, cinematográfica ou mesmo arquitetônica. Nossa opinião leiga é imbuída com ingenuidade e sinceridade de quem não entende ou entende errado o que vê.

Você caro leitor deve estar a se questionar o que o Chico quer dizer desta vez colocando este trecho benjamínico e o comentando puxando para esta parte artística que o texto carrega. O Chico quer tratar aqui diretamente de teatro. De uma peça que ele viu com Benjamin e com toda a família Chico neste sábado dia 8 de setembro.
O nome da peça? "El Truco". O lugar? Espaço Satyros 2, na Praça Franklin Roosevelt. O enredo? Na Segunda Guerra Mundial diversas pessoas estão trancadas num bunker para se proteger dos bombardeios e das batalhas. Estas se propõe a encenar "Sonho de uma noite de verão", de Shakespeare. O tema? Uma batalha entre ficção e realidade; uma demonstração da loucura; da "vida como ela é"; do nosso lado animal; das máscaras-personagens que usamos; uma visão sobre o mundo louco que quer que sejamos isto ou aquilo.
Não quero dizer que este tema seja de pouca importância muito menos que estes questionamentos não devem ser levantados contudo tenho de admitir que a peça para mim foi um martírio. Nenhuma cena passava sem a menção, simulação ou propriamente exibição explícita de algum aspecto sexual qualquer que seja. Não existiu um momento em que as falas, os movimentos, os corpos, os olhares ou as andanças em cena não passassem uma conotação extremamente sexual e vulgar. Para mim isto não é qualidade, não é vantagem.
Parece muito carola, muito ridículo, muito conservadoramente podre e retrógrado esse meu ataque ao excesso de sexo. Eu não me importo que seja. Me importo com a minha incapacidade de prestar atenção em um enredo com tantos floreios sexuais. Só consegui abstrair alguma coisa daquela encenação pelas minhas conversas posteriores com as pessoas pois na hora eu só pensava em levantar e ir embora.
Fiquei durante um bom tempo me perguntando o porquê da minha extrema repulsa a tudo isso. É complicado criticar principalmente sendo leigo. Muitos diriam que eu deveria ter retirado meus filtros-de-preconceitos antes de entrar na peça e é por aí que eu começo. Preconceitos? Preconceitos tem contra o que digo aqueles que me acusam de carola e retrógrado. Mais despido de preconceitos que fui impossível justamente indicado pelo fato de eu não ter ficado chocado com a enxurrada sexual e sim irritado. Para mim parecia totalmente descabido e desnecessário contar aquela história daquela maneira. Fui sem nenhum preconceito e o que vi, puramente falando, foi um punhado de cenas sexuais que para mim nada acrescentaram. Pareceu-me justamente o "choque pelo choque". O único problema é que minha geração não se impressiona com sexo do mesmo jeito que a dos meus pais. Nasci do sexo. Cresci com sexo na TV. Sexo transpirando pelo computador, pelos outdoors, pelo rádio, pelas músicas, pelas baladas, pelas gírias. Tudo fala de sexo. Os filmes que eu assisto só tem sexo. Como diz o Benjamin, revolucionário para nós (faço das palavras dele as minhas) seria não falar de sexo, não contar as coisas com sexo.
O que seria pra chocar, para me causar impressão aflitiva causou-me vergonha. Não vergonha pudica, vergonha de carola, de virgem da igreja da Santa Maria Imaculada Conceição mas uma vergonha relacionada com a falta de lugar deste sexo, com seu descabimento. Uma vergonha de estar tão insanamente inseguro observando aquilo que para mim não fazia o menor sentido.
Não entendo o sexo desta maneira. Não entendo a quantidade de vezes que este apareceu na peça. Se foi para insinuar um clima de loucura e de insanidade da guerra não me pareceu convincente pois não me parecia um sexo sujo ou desesperado mais luxurioso e insinuante. Imagino que na guerra, em qualquer uma, cenas de violência sexual sejam comuns, mas cenas secas, duras, com muito choro, raiva, tristeza, tragicidade. Não consegui captar isso nas insinuações orgiásticas do grupo.
Não entendi a necessidade de mostrar os seios de algumas atrizes. Não entendi a necessidade de simular masturbação em uma dancinha patética. Não entendi a necessidade do uso de um pênis de borracha numa simulação do ato sexual no qual o portador do membro vestia máscara de cavalo. Isso era pra quê?
É possível mostrar tudo o que foi mostrado de outro jeito, tenho certeza. É evidente que é possível argumentar que tal jeito seria, de uma maneira ou de outra, totalmente diferente do antigo mas para mim isto não representaria perda e sim melhora. Melhora por que não precisamos que realizem tal ultraje à nossa imaginação, à nossa capacidade de criar metalmente o clima. Não sinto apuro por questionar as coisas desta maneira.
Pergunto-me verdadeiramente qual é a intenção de uma peça teatral que tem como platéia um público evidentemente leigo, um público que não escreve, atua, dirige ou estuda teatro. Presumo que as peças tem como objetivo (não sei se é a melhor palavra) uma comunhão ator-platéia com o intuito de relatar alguma mensagem; uma espécie de envolvimento em razão de um questionamento, seja trágico, cômico ou romântico, da realidade; um corte interessante da mesma; uma nova visão; uma crítica à um aspecto presente, passado ou até futuro. Só presumo. Esta peça não teve tal efeito em relação à mim. Os temas que ressaltei foram uma tentativa de recorte mas não posso dizer que tal tentativa foi bem feita. Esse envolvimento, essa comunhão, esse "passar algo", não conseguiu me atingir. Cavei raso. Para passar tudo aquilo seria extremamente necessário tal leitura sexual?
É isso que venho discutir. Não a relevância dos questionamentos pretensamente trazidos mas esse desastroso jeito de ver tais questionamentos. Porquê todo tipo de inovação artística polêmica tem de passar pelo sexo?
Para mim sexo não é mais tabu. Devo estar cometendo milhares de crimes psicológicos freudianos e de crítica teatral com este texto mas eu não me importo. Me revolto com a necessidade que têm-se por todo o lado de se falar sobre esse assunto. Tesão reprimido.
Bombardeam-nos pelo lado "pop" ou "de mercado" da cultura com os humps da Fergie e pelo lado underground dos teatros da praça Roosevelt.
E agora? Onde me esconderei? Num bunker? Que tal encenarmos "Sonho de uma noite de verão"? Nossa, mas que idéia, cara. Boa mesmo, filhão.

2 comentários:

Sparkling Diamond disse...

Concordo sim.
Não vi a peça, mas sei que esse apelo "visual" que envolve o sexo é real. Nitidamente.
Sempre para "chocar" e não para em si fazer algum sentido.
Se alguém fica nu por um motivo que indique algo na peça, como descoberta do próprio corpo e do próprio sexo(masculino, feminino) ou quando o sexo faz parte da peça como um fator essencial na vida dos personagens, é explicável que o teatro possa retratar isso. Tanto pois o palco é a FreeZone de total liberdade corporal e espiritual. Você diz o que quer, você fica do jeito que quiser. Mas tudo isso com um significado implícito.
Apelação visual já virou normale.

Unknown disse...

bah, nao gosto de releituras de shakespeare, coisa mais chata que existe.
ai, a pior coisa que existe é cena de sexo com piadinha, simulaçoezinhas. dá vergonha alheia.
mas quanto a grande presença de sexo por todo lado, essa banalização, é um reflexo de todos nós, de uma banalização que a gente mesmo cria.
acho que nada que apareça tanto ao nosso redor aparece por nenhum motivo.
sexo nao é mais tabu nem revolucionario, mas nao sei se acho necessariamente ruim a gente falar tanto sobre isso.