segunda-feira, agosto 04, 2008

Gente, tenho certeza absoluta que tá bem chato "acompanhar" o Palavras. Isso é ruim por que depois que a gente desacostuma de acessar um blog acessá-lo de novo é muito difícil, é que nem retomar um hábito. De qualquer maneira lá vai o Chico, depois de alguns meses, retomar as postagens. Estou com a meta de pelo menos um texto, texto sim, por semana. Acho que eu consigo.

36.


Nossa satisfação quando eles são punidos
Prazer e degustação de algemas

Quando um cara pobre é preso pessoas existem aquelas pessoas que falam "bem feito, vagabundo", existem aquelas outras que agradecem a Deus, existem ainda outras que gritam "bandido", aquelas que ficam com pena e ainda outras que, numa análise da conjuntura do Brasil, pensam o quanto aquela prisão representa a criminalização da pobreza, o controle de massas, do proletariado urbano subempregado, independente de sua culpa. É, na minha opinião, uma análise coerente. Faz sentido pra mim. Além disso geralmente quem tem esse discurso fala em garantias, em direitos que aquela pessoa têm e que deve ser respeitados, sua dignidade etc.
A pergunta de hoje é: e quando um Daniel Dantas, corrupto-rico-branco-e-banqueiro, é preso? Não acho que a importância da situação do Daniel seja superior à do Fulano, do Cicrano ou do Beltrano que foram presos conforme o descrito no primeiro parágrado. As garantias devem ser as mesmas, isso eu não vou nem tocar. E também não vou nem entrar no debate de que o Daniel vai ser privilegiado no acesso à justiça e à essas garantias. Ele vai. Vai ser privilegiado, vai ser prioridade, vai ser julgado primeiro e inocente. Vai pedir um "abreoscorpus" e o presidente do Supremo Tribunal Federal, homem do Judiciário brasileiro, vai conceder e vai passar por cima de todo mundo pra isso. Isso, também não quero me alongar aqui, vai acontecer, por óbvio, por que o Dani é branco, rico e banqueiro.
Mas voltemos à pergunta. Quando o Dani é preso, o que sentimos? Se eu acho mais coerente fazer aquela análise sistêmica quando aquele outro é preso posso fazê-la também com o caso do nosso amigo aqui. Sim, ele é um banqueiro que aproveita de sua situação financeira para viver fora dos limites do insuficiente estado democrático burguês, burlando mesmo a lei que é feita para lhe privilegiar. Ele é um dos sócios do capital transnacional que está se lixando para a desigualdade social brasileira ou para nossa legislação ambiental. É bom que ele seja pego, que ele pare de fazer o que faz, mesmo que seja por alguns dias? É bom que ele seja impedido de ser 10% o que ele é? Na minha opinião sim.
Tá, mas até agora eu não falei nada que seja original ou que alguém já não houvesse falado antes. Calma, vou achar ainda o ponto.
Dadas as situações expostas eu irei além perguntar o que efetivamente sentimos e desejamos em relação aos dois personagens da nossa história, o amigo do primeiro parágrado e o Dani.
Pelo primeiro sinto, e falo por mim, um sentimento que acho que deriva daquela análise que eu falei. Não sinto pena, não, mas acho que indignação por conta do que a sua prisão representa no país onde vivemos, para sua família e para sua comunidade. Acho uma bosta que ele seja preso, ele ter tido uma vida que lhe deixou como opção dentre as suas escolhas uma ação que resultará em uma temporada de maus-tratos e a entrada para um mundo onde não existem direitos, onde ele não será nem de longe um cidadão. Para ele defendo um direito penal mínimo, que puna com o objetivo de fazer com que essa pessoa pense sobre seus atos e adquira consciência sobre o mal que fez, se é que ela efetivamente o fez. Além disso, é claro, esse direito penal mínimo incluído em todo um contexto onde o nosso amigo poderá voltar pra casa e ter em seus possíveis caminhos atalhos melhores e mais dignos dos que rumou.
E o Dani? O que sinto no fundo quando ele é preso? O que sentem as pessoas que partilham de minha análise? Feliz? Regojizo-me em ver o carequinha com algemas ou o Pitta saindo de sua casa de pijama? Para eles defendemos o direito penal mínimo? Admito que a primeira vez que eu vi ele sendo preso eu fiquei feliz, num tava nem aí. "Que bom que esse desgraçado que vive sem limites agora tem um, o da lei" - nessa hora eu parei subitamente esse meu pensamento e meta-pensei: "Calma, você viu/ouviu o que você acabou de pensar?".
"Esse desgraçado que vive sem limites agora tem um, o da lei". Se essa frase fosse dita para o cara do primeiro caso... se esse sentimento de vingança, de prazer, tivesse lugar na primeira situação e eu me visse dizendo ou pensando isso eu me acharia um dos seres mais cruéis ao sul do Equador - por que a recíproca não é verdadeira? Eu sei que as formas não são livres de seus conteúdos e que as duas situações são diferentes, mas no limite, são prisões. Quer dizer que a lei dura e que prende eu reservo só pra um dos segmentos da população, o mais privilegiado? Pior que isso, por que a lei é só o meio do caminho: será que a sede de sangue, a satisfação por ver algemas eu só tenho (de qualquer jeito, tenho) quando eu vejo as algemas nos pulsos ao lado de um Rolex? Eu não sou contra leis que criam desigualdades, não. Cotas, por exemplo, eu acho que fazem sentido, ou mesmo aquelas leis que protegem as mulheres, a diversidade sexual ou outras minorias oprimidas. A questão é se essa desigualdade faz sentido e se esse sentimento de vingança é saudável, compatível com a minha visão de mundo e com meu projeto de país e de sociedade.
Então, não é. Repensando percebi como pouco faz sentido um sentimento desses no mundo que eu quero, ou na construção do mundo que eu quero. A lei deve ser dura com o Daniel Dantas sim, não tenho dúvidas disso, mas ela não pode deixar de impedir ou lutar contra um sentimento desses, por que quem mais se aproveita dele não é o esfomeado da esquina, mas sim o bem-satisfeito do Fasano, srs. Frias, Marinho e Mesquita, que favorecem e protegem os srs. Setúbal, Ermínio de Moraes e, por que não, Dantas, que são sócios minoritários dos fundos ou consórcios transnacionais trilhardários sem nome. Esse sentimento não só faz vender o jornal, mas como desvia a noção do todo para a noção do particular, permite ao patrão reclamar da corrupção ao lado do empregado ao mesmo tempo que ele o manda sonegar algumas notinhas.
Esse desvio da atenção ao todo para a atenção ao particular é muito perigoso. Nos sentirmos felizes com a prisão do Daniel é, para além de bobo, infantil e meio cruel, uma enorme burrice porque depois de preso ele virará um ótimo exemplo de banqueiro corrupto, condenado pelos preocupados banqueiros bonzinhos, que sustentam os jornais-e-revistas-e-tvs-de circulação nacional que apontam-lhe o dedo e discutem se ele deve ou não ser submetido ao uso de algemas. Perde-se a noção que os bonzinhos são tão responsáveis pelo amigo do primeiro parágrafo ser preso e que ficar feliz e comemorar as algemas novas do Dani é esquecer que, além das algemas não serem uma coisa legal para se punir as pessoas, independente elas quem forem, os crimes que ele cometeu não são o cerne da questão social brasileira, da desigualdade, da miséria e da pobreza.
O que eu estou querendo dizer é que esse sentimento não tem ou não deve ter lugar quando pensamos o ideal e que as análises das situações, mesmo em mesas de bar, devem passar longe dele. Repetindo-o ou usando-o propagamos um senso comum manco que, além de anti-garantias, maqueará o verdadeiro problema, que existem Daniéis Dantas pelo Brasil que conseguem tudo o que ele consegue e não são presos e que ainda outros nem precisam fazer o que ele fez para explorar os trabalhadores que residem nos enormes bolsões de favelas nas periferias das grandes metrópoles.
O verdadeiro problema do Brasil, para ser percebido, passa por começarmos a falar mais do todo e menos do particular.

4 comentários:

Silas Cardoso disse...

Nossa chico, muito ruim o texto. Muito ruim mesmo. Recomeçou o blog com o pé esquerdo (ou direito, enfim). Idéias confusas e umas relações bem toscas. Essa semana agnt discute melhor o tema, tá? Mas vc tem potencial pra melhorar... Bjo do gordo!

Silas Cardoso disse...

e o layout anterior do blog tava muito melhor... esse novo t� muito igual aos cartazes q vc faz pro FdE, projeto gr�fico igualzinho...n�o sei se � bom isso.

Chico disse...

Silas, puxa, que contundente.
Bom, acho que a confusão é normal e vêm do processo da volta a escrita nesse espaço, que é pra mim tão caro mas que a tanto tempo eu não voltava. Não sei se concordo que as relações são toscas, mas coloco que não identifiquei no objeto nenhuma relação causal, e isso é importante.
Sobre o layout, eu vou dar uma mudada, mas sei lá também. É bem o meu jeito de apresentar as coisas, né.

Marcio Zamboni disse...

em sociologia jurídica chamamaríamos isso de um confronto entre uma política de princípios e uma política de sujeitos.
a vantagem de uma é a fraqueza da outra: uma ignora que, na realidade, há diferenças e acaba ficando meio ditante e a outra refirma, se não cria, diferenças indesejáveis. você meio que optou por um mix, o que quebrou toda a (fraca) argumentação do texto.
concordo com o silas, acho que vc faz melhor, sinceramente...